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“Mãe, sou não-binário!”. Que quer isto dizer, afinal?

Aos poucos vamo-nos apercebendo, enquanto pais e adultos, que a identidade de género e a orientação sexual são percebidas de forma muito diferente hoje em dia do que eram quando nós eramos adolescentes.

Hoje, o género não tem apenas um número finito de opções, mas parece ser como um espectro de variações. Também na sexualidade parece haver uma maior liberdade e aceitação das diferentes escolhas. Muitas crianças e adolescentes manifestam-se abertamente apoiando a causa LGBT+ e preocupam-se muito com a homofobia.

Como esta é uma realidade diferente da que conheceram na sua infância e juventude, os pais podem sentir-se perdidos na melhor forma de entender e comunicar com os seus filhos.

Em que idade é definida a identidade de género? 

Quando falamos de identidade de género falamos da identificação íntima e pessoal com o género e que pode corresponder ou não ao género atribuído à nascença.

Desde a infância que as crianças percebem as diferenças anatómicas e iniciam a aprendizagem dos papéis, atitudes e comportamentos de género. A identificação com o género inicia-se assim na infância e é importante que desde esta fase seja dado espaço às crianças para expressarem e explorarem  as suas expressões de género (papeis, atitudes e comportamentos).

Assim, não há uma idade  definitiva e final, mas sim um processo de exploração e crescimento que é progressivo e até pode mesmo ser fluído e vir a ter mudanças que nos parecem grandes e inesperadas mais tarde.

O que é ser não binário?

O termo não binário refere-se às pessoas que não se identificam necessariamente como pertencendo a um dos géneros, ou seja a sua identidade de género vai para além do binómio masculino/feminino, sendo possível que se identifiquem com ambos os géneros ou mesmo com nenhum.

Pode ser confuso hoje em dia sentir tanta liberdade de auto-determinação e diversidade em função do género, mas os adultos e os jovens não tiveram sempre uma distância entre si e em como viam o mundo?

 Desvalorizar e tratar como se fosse uma moda só vai afastar mais os pais, mães e outros adultos dos jovens e das suas vivências.

Como é que podemos ajudar as crianças no seu processo de inclusão?

Importa olhar para o masculino e feminino não como polos padronizados e opostos mas mais como um continuidade de possibilidades ao longo do qual cada um de nós se pode identificar e expressar em termos de género.

Assim, é importante que durante o desenvolvimento  as crianças ou adolescentes possam explorar e expressar as suas expressões de género e a  sua individualidade, (não sendo condicionados  a modelos de género pré-concebidos).

Os adultos próximos também poderão abordar de forma positiva as questões de identidade e expressão de género de forma a que os/as jovens sintam a segurança de ser aceites, sintam a possibilidade de fazer um “coming out familiar” (se e quando o  quiserem fazer), e se sintam valorizados enquanto pessoas, para além do género e das suas expressões.

Importante também que os adultos procurem estar presentes ,atentos e disponíveis numa postura de abertura, promovendo momentos de diálogo e expressão de sentimentos.

Criando contextos de partilha, diálogo, expressão de sentimentos num ambiente de respeito mútuo os pais estão a favorecer modelos saudáveis de comunicação  e a contribuir para um contexto familiar de integração. 

É ainda importante que as figuras parentais possam apoiar a criança ou jovem no que for necessário, procurando também perceber e respeitar a forma como preferem ser tratados bem como a utilização de pronomes mais ajustada.

Sabemos que quem explora a sua diversidade sexual e de género com apoio familiar o faz de maneira mais saudável, mais protegida de discriminações e com maior satisfação – seja qual for o destino a que chega ao longo da sua juventude e como adulto.

O amor incondicional das famílias é muito valioso nesta descoberta e como ferramenta de resistência e proteção pessoal dos riscos sociais existentes de discriminação e violência.

Como ajudar os adultos a entenderem e aceitarem?

É importante os pais saberem que é natural terem dúvidas e preocupações relativamente à diversidade de comportamentos e expressões de género das crianças e adolescentes e terem consciência de que precisarão de tempo para se adaptar à nova realidade e que também eles estão em processo de adaptação, durante o qual poderão atravessar diferentes estados emocionais também naturais aos processos de adaptação. Poderá ainda acontecer que os vários elementos familiares se adaptem de formas e em ritmos diferentes mas é importante que saibam que poderão conhecer-se melhor neste caminho e saír mais coesos enquanto família.

Por vezes observa-se a tendência de auto-culpabilização dos pais pelo percurso dos filhos, mas a afirmação dos filhos relativamente à sua identidade e expressão de género e orientação sexual não contém em si nada de negativo, como apenas diz respeito à individualidade destes.

Desenvolver e adoptar uma atitude positiva relativamente à orientação sexual e expressão de género dos seus filhos e filhas é importante e para tal os pais poderão recorrer ao apoio de instituições ou profissionais especializados nestas temáticas que os ajudem no esclarecimento de questões e na desconstrução de crenças e preconceitos.

Para os ajudar nesse processo poderão também frequentar grupos de pais ou falar com pais que tenham atravessado situações semelhantes. Procurar informação rigorosa e científica pode igualmente ajudar, mas tendo em atenção as fontes de onde se bebe, pois há muita informação online que é pouco fiável e enganadora.

É importante que se valorize a confiança e a abertura como meios para a inclusão da família e dos pais no crescimento e nas descobertas que o adolescente está a viver no amor ou nas relações.

Com que idade é definida a orientação sexual?

A orientação sexual refere-se à atracção sentida (física, afectiva, emocional e sexual) em termos do género relativamente ao género do próprio.

Na adolescência, fase importante da experimentação sexual dão-se alterações biofisiológicas, psicológicas e sociais expressivas e é também na puberdade ou adolescência que se observa uma especificação da orientação sexual embora a percepção da orientação sexual também possa ocorrer na idade adulta (podendo haver ainda um desfazamento temporal entre a percepção da orientação sexual e a revelação da mesma).

Assim, a orientação sexual é melhor entendida em termos de um processo que se desenvolve ao longo da vida do que um evento que ocorre num momento determinado.

Os adolescentes são muito curiosos sobre os diferentes tipos de orientação sexual: falam de ser gay, bi, assexual e aromantic, pansexual (…).

Porque é isto tão importante para eles? 

A adolescência é a fase mais activa da exploração e afirmação da identidade, o que engloba a exploração da identidade sexual, e as terminologias também podem ser entendidas como buscas de expressões por parte dos jovens que melhor definam e expressem a sua orientação sexual.

A adolescência como fase de exploração e experimentação da vida tem realmente esta necessidade de encaixar num modelo, de pensar que o seu modelo é melhor que os outros? Quem nunca pensou que “os outros” se vestem mal, ouvem a música errada e ainda não perceberam como resolver os problemas do mundo?!

Neste momento, e na nossa cultura ocidental, europeia, global a auto-determinação em função do sexo e género é fundamental. Os jovens de hoje cresceram num mundo em que as minorias sexuais e género têm uma visibilidade nunca antes vista, têm direitos humanos defendidos e implementados e acedem a uma igualdade que a história não oferecia antes. É natural que os jovens de hoje sejam mais sensíveis à homofobia e transfobia e que se zanguem com uma sociedade que ainda não é inteiramente respeitadora e inclusiva. 

Mas não são só os jovens que podem ter orientações e identidade fluídas e mostrarem mudanças ao longo da vida- também acontece aos adultos. 

Associamos categorias de identidade à orientação sexual, mas talvez fosse mais correto pensarmos as nossas vivências afetivas e relacionais como menos deterministas e mais livres. Talvez as grandes perguntas não sejam “o que sou?” mas “onde estou?” no que toca à diversidade de género.

 Como é que os pais devem lidar com a orientação sexual dos filhos de forma a ajudá-los a terem uma vida plena e realizada?

É importante que os pais e mães consigam promover espaços de diálogo nos quais os adolescentes se sintam seguros para partilhar e expressar as suas opiniões e sentimentos e se sintam aceites para fazer um coming out. 

É relevante também que os pais e mães adoptem uma postura de abertura, compreensão, valorização e aceitação das opiniões e expressões emocionais dos filhos procurando não as desqualificar ou criticar.

Os pais podem procurar informação e ajuda especializada para esclarecerem dúvidas, desconstruírem crenças e preconceitos e desenvolverem e transmitirem a mensagem de que as pessoas com orientações sexuais minoritárias podem ter vidas plenas e realizadas.

Apesar de nos processos de adaptação os pais poderem precisar do seu tempo para digerir as suas emoções é importante que não se adopte uma postura de silêncio sobre o tema, que não se culpabilize a criança ou jovem pelas adaptações familiares e que se continue a conseguir momentos de vivências afectivas familiares.

Relativamente aos namoros dos filhos com orientações sexuais minoritárias é importante que os pais procurem agir de forma semelhante à adoptada nas relações amorosas dos irmãos.

No processo geral é importante que os pais contribuam para que os filhos lidem de forma positiva com a orientação sexual e identidade de género e que estes se sintam aceites, seguros de si e preenchidos em termos de auto-estima, num contexto de tanta importância como o familiar. 

Os pais e mães estão assim a contribuir para que os seus filhos ou filhas se tornem mais resilientes para lidar com situações mais desafiantes provocadas por fatores de stress externos.

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